1a Roda de Conversa do Tiradentes em Cena promoveu um importante debate sobre a representatividade negra, não apenas nas artes, mas na vida.
A presença do negro na dramaturgia e no teatro brasileiro é desfigurada e desumanizada. Poucos autores conseguiram desviar o olhar do tratamento dado ao negro em seus espetáculos. Por isso, a necessidade em se promover uma roda de conversa com o tema “Teatro Negro – Representatividade e Resistência”.
Mediada pela gerente de cultura do Departamento Regional do Sesc Minas Gerais, Maria Carolina Fescina Silva, o encontro contou com a participação de um dos nossos homenageados, o cantor, instrumentista, ator e compositor Maurício Tizumba; com o capitão do Congado Nossa Senhora do Rosário e Escrava Anastácia, Mestre Prego; com o diretor e ator do grupo de teatro local Entre & Vista; e com o professor do Curso de Teatro da Universidade Federal de São João Del Rei, Dr. Adilson Siqueira.
Apesar da chuva pesada, que ainda insiste em cair em solo tiradentino, mais de 50 pessoas ocuparam a sala Alvarenga Peixoto, o teatro do Sesi – Centro Cultural Yves Alves. Por mais de duas horas, os participantes retrataram e debateram uma cruel realidade – a dura desigualdade e o inaceitável preconceito, não apenas nas artes, mas no dia-a-dia de uma minoria numerosa demais no Brasil.
Mestre Prego queixou-se da dificuldade de se arranjar patrocínio para a sua arte, visto que, muitas vezes, não é, ao menos, bem-vindo, nos lugares onde vai na cidade: “Nesses cinco anos, que é a existência do nosso grupo de congado, a gente sai pedindo ajuda financeira – nas pousadas, nos restaurantes – e tem pessoas que até viram as costas pra gente, que manda dizer que não se encontra”. Em uma cidade como Tiradentes, onde os nativos, inclusive, negros e mestiços, foram “gentilmente” expulsos do Centro Histórico, não é de se espantar que algo do gênero ainda aconteça.
Para Sérvulo Matias, é muito importante refletir em relação ao negro, ao teatro negro. E vai além: “Sobre a tolerância, a intolerância, eu gostaria de colocar mais uma palavrinha, que é o respeito. Eu acho que a gente tem que ter respeito, e uma outra coisa também – amor. Somos um país bem diversificado, de origens diversas, e eu acho que o nosso objetivo maior é o amor. A gente precisa do amor. O amor precisa prevalecer em nossos corações”.
Tizumba, que falou tanta coisa séria com bastante humor, explicou que toda manifestação de arte vem das manifestações religiosas. Desde a Grécia antiga até os dias atuais. E falou da importância de se trabalhar a arte negra: “Vamos tirar a tolerância. Vamos usar o respeito. Temos que continuar lutando, criando possibilidades. Essa nossa matriz africana é muito importante na arte do teatro que a gente faz hoje. Se a gente cria uma companhia de teatro negro é para que outros negros possam vir trabalhar no teatro. O teatro tem que deixar de ser uma coisa de branco. Tem que ser uma coisa para todo mundo. E a gente precisa é de consciência e respeito, no lugar da intolerância, que só assim a gente vai construir um país melhor pra todos nós, em termos dessa própria igualdade, que está faltando nos dias de hoje e está causando essa vergonha que sentimos do nosso Brasil”.
Para encerrar, o professor de teatro, Dr. Adilson Siqueira, explanou sobre a importância da representatividade negra, não só nas artes, mas em todos os setores. “Essa questao de representatividade, dessa necessidade do negro precisar de uma mesa para discutir, é justamente por causa da invisibilidade. Onde é que o negro é invisível? Ele é invisível na situação de poder. Quanto mais escuro é o tom da pele da pessoa, mais baixo essa pessoa está na escala social. É por isso que a luta precisa continuar. A representatividade é necessária para que a gente consiga dar visibilidade para essas pessoas, para que outras pessoas que não têm onde se espelhar possam se espelhar e querer sair desse lugar de invisibilidade. Para isso que existe a necessidade de uma representatividade, tanto no teatro, quanto na vida”.
Roda de Conversa finalizada, todos os participantes foram para o Spasso Escola de Circo, onde, extraordinariamente, acontece a abertura do 5o Tiradentes em Cena.